Situação só tende a se agravar, diz pesquisadora do Rio Jucu
28 de dezembro de 2013
por Fabio Malini
Em uma investida sobre a internet, encontrei o excelente trabalho dissertativo de Miquelina Aparecida Deina sobre as alterações no solo e da água no baixo curso do Rio Jucu (ES). Mestre em Geografia, Miquelina me concedeu uma entrevista, por email, em que avalia as medidas adotadas pela Prefeitura de Vila Velha para acabar com o alagamento da região do Canal de Guaranhuns.
Em seu texto, a pesquisadora é categórica em afirmar que é a aceleração do crescimento populacional da região do Baixo Rio Jucu (onde há a Pontal das Garças, o Condomínio Riviera etc) a maior causadora do aumento de áreas impermeabilizadas, remoção da vegetação, construção de canais de drenagem, essas são mudanças que têm promovido escoamento superficial mais acelerado em direção ao Jucu, fazendo com que um maior volume de água atinja mais rapidamente o canal principal.
Qual é a sua trajetória de estudo do Rio Jucu?
Estudei o baixo curso do rio Jucu, cujo principal objetivo foi efetuar análise das alterações hidrológicas (vazões máximas, cotas altimétricas etc.) e geomorfológicas desta porção da bacia, enfatizando, especialmente, o avanço da urbanização para áreas cada vez mais próximas ao canal principal do rio e as consequências desse processo de ocupação, que em grande medida ocorre de forma desordenada.
Em linhas gerais, os principais resultados mostraram que à medida que a urbanização avança, ocupando as planícies fluviais do baixo Jucu, há um aumento dos picos de vazões máximas (m³/s), pois a urbanização promove a impermeabilização de grandes parcelas de solo impedindo a água de infiltrar. Esta por sua vez, escoa com maior velocidade e em maior quantidade para o leito do rio Jucu, fazendo com que o mesmo atinja picos de vazões máximas com mais frequência vindo a transbordar.
Contudo, é importante lembrar que muitos bairros do município de Vila Velha estão assentados em planícies fluviais sujeitas naturalmente aos eventos de alagamentos e inundações. Um exemplo bastante emblemático é o bairro Pontal das Garças. O que ocorre nestes casos é que a partir da ocupação desordenada destas áreas estes eventos de inundações se agravam tornando-se mais frequentes e deixando um rastro de prejuízos econômico, social e ambiental.
Por que esses bairros novos da região do canal de Guaranhuns foram os mais afetados?
Podemos citar várias razões. A primeira é porque se trata de bairros assentados sobre áreas da planície fluvial do Jucu. As planícies fluviais são áreas planas e com baixa topografia o que facilita o acúmulo da água.
Além disso, nesta região há várias porções da superfície que estão abaixo do nível do mar, gerando um problema de escoamento ainda maior. Isso ocorre porque em função das condições topográficas da região (baixa topografia), associada a fortes chuvas e marés elevadas, a água pluvial não consegue escoar para o mar, uma vez que as comportas de saída dessa água precisam ser fechadas para que a água do mar não adentre o continente. Isso é muito comum em Vila Velha.
Nesses casos é bastante comum o bombeamento da água para fora do continente. Entretanto, Vila Velha possui um sistema bastante precário de bombeamento.
O prefeito tentou abrir valas na foz do Rio Jucu? Qual é a sua avaliação técnica dessa medida?
Na realidade, como não estou no Estado no momento, não tenho acompanhado de perto essas obras.
Mas pelas informações que tenho conseguido via internet e outros meios de comunicação, a medida adotada pelo prefeito é no mínimo muito ingênua. Como falado anteriormente, há vários bairros que estão abaixo do nível do mar, logo essa medida provavelmente não conseguirá solucionar o problema.
Além disso, a dinâmica da água é bastante complexa. É necessária muita cautela quanto a esse tipo de obras, pois há risco de graves danos ambientais além de um possível agravamento do problema em vez de sua solução.
Sou dessa região (coqueiral de itaparica) e me lembro que essa região de gaivotas era um grande alagado. Pensava que era imaginação de crianças. Mas, lendo o seu trabalho, vi que não era delírio infantil. É quase natural que o Rio Jucu se espalhe em alagamentos. Quais são os principais fatores que potencializam os alagamentos do Rio Jucu? O Dique, hoje, aguenta tanta água de chuva?
Esse grande alagado do qual você se lembra faz parte de um processo natural.
As planícies fluviais de um rio ou também conhecidas como planícies de inundação, na realidade são partes integrantes do rio. Numa linguagem mais simples, é como se elas fossem uma extensão do rio, pois entre as funções da planície de inundação é dar vazão a água do leito principal quando em eventos de grandes cheias.
Logo, é fácil entender o porque de tantos alagamentos nos bairros sobre influência do Jucu, pois parte deles estão em áreas que na realidade são partes integrantes do próprio rio, ou seja, são áreas inadequadas a ocupação humana.
São áreas que sempre alagaram e não é porque estão sendo ocupadas que deixaram de alagar, pelo contrário, a situação tende a se tornar ainda mais grave, com a impermeabilização do solo, a ocupação desordenada etc., como vem ocorrendo nesta região.
Quanto ao dique não sei precisar se ele aguenta ou não. É necessário um estudo de engenharia para verificar isso com exatidão. O que me lembro é que no ano de 2009 segundo informações de vários meios de comunicação, depois de fortes chuvas também sobre a influencia da Zona de Convergência do Atlântico Sul (como a que vivenciamos agora), o dique corria o risco de transbordar e ao transbordar poderia solapar. Neste período foram feitas obras emergenciais para erguer a barreira e reforçá-la.
Nesse contexto, é importante assinalar que as chuvas dos últimos dias foram muito mais intensas do que as chuvas de 2009, quando o dique precisou passar por reparos.
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